De: Adriano
Benayon [mailto:abenayon.df@gmail.com]
Enviada em: terça-feira, 27 de agosto de 2013 00:14
Para: 'Josue AB'
Assunto: artigo: Mais uma crise
Enviada em: terça-feira, 27 de agosto de 2013 00:14
Para: 'Josue AB'
Assunto: artigo: Mais uma crise
Mais uma crise
Adriano Benayon * - 26.08.2013
01. Transcorreu agora o 59º aniversário do modelo
dependente, implantado a partir de 24 agosto de 1954, data da deposição do
presidente Getúlio Vargas.
02. O atual quadro da economia brasileira deixa clara a
iminência de mais uma devastadora crise externa, tão ou mais profunda que
as anteriores, como a que levou à moratória submissa em setembro de 1982
(cessaram os pagamentos por falta de divisas), e a do final de 1998 com o
mesmo problema.
03. É o déficit (saldo negativo) com o exterior nas transações
correntes (mercadorias, serviços e rendas) que faz explodir a dívida externa e
suscitar a incapacidade de fazer face ao serviço dela sem sofrer a intervenção
dos bancos estrangeiros e de seus colaboradores, como o FMI e o Banco Mundial.
04. De janeiro a julho de 2013, esse déficit ascendeu a U$ 52,5
bilhões, quantia quase igual à do déficit total de 2012 (US$ 54,2
bilhões). Em 2013, ele já corresponde a 4% do PIB, sendo que no caso do Brasil
sequer o PIB é nosso, pois a economia tem sido grandemente desnacionalizada.
05. O déficit cresce demais nos últimos anos. De 2008 a 2012,
somou US$ 204,1 bilhões. No atual ritmo, 2013 poderá ultrapassar 50% do total
acumulado nesses cinco anos.
06. Os déficits nas transações correntes são causados pela
volúpia das empresas transnacionais de transferir lucros às suas
matrizes, nas sedes destas e em paraísos fiscais.
07. Os lucros transferidos como lucros, embora imensos, são
muito menores que os transferidos disfarçadamente em contas do balanço de
serviços e no de mercadorias, através do subfaturamento das exportações e
superfaturamento das importações e até mesmo de operações fictícias.
08. A característica do modelo dependente é a progressiva
entrega dos patrimônios nacionais às empresas transnacionais. O mercado foi o
primeiro desses patrimônios doados, através de incríveis privilégios, ao
capital estrangeiro, começando com a liquidação da indústria automobilística
nacional e a entrega do mercado às montadoras transnacionais no governo de
Juscelino Kubitschek.
09. O senador Vasconcelos Torres (1920/1982) publicou em 1977 o
livro “Automóveis de Ouro para um Povo Descalço”. Decerto “ouro” referia-se,
não à qualidade dos automóveis, mas ao preço deles.
10. A p. 94 relatava o senador:
“a) No exercício de 1962 foi registrado, no balanço
consolidado das onze empresas produtoras de veículos automóveis e caminhões, lucro
de 65% em relação ao capital social, constituído por
máquinas usadas, e aumentado posteriormente, com incorporações de reservas e
reavaliação dos ativos.”
11. De fato, como tenho mencionado, as empresas estrangeiras da
indústria automotiva e de outras indústrias - favorecidas por instruções
da SUMOC, o banco central à época) - puderam, a partir de janeiro
de 1955, importar equipamentos usados, de valor real zero, pois estavam há anos
amortizados, e registrá-los, como se fossem investimento em moeda, pelo valor
que declarassem.
12. Isso significa que o Brasil lhes deu um privilégio incrível,
semelhante ao dos bancos, que ganham dinheiro criando dinheiro do nada, com
lançamentos contábeis, ao conceder empréstimos. Além disso, beneficiadas
pelo custo real zero do capital e da tecnologia, as transnacionais esmagaram a
concorrência de empresas locais.
13. Vasconcelos Torres, op. cit. p. 95, apresenta uma tabela
referente aos balanços de 1963, comparativa de preços de venda da fábrica à
distribuidora com os preços de venda do distribuidor ao público, abrangendo
quatro montadoras, entre elas a Volkswagen, já então a maior produtora no
Brasil.
14. O preço nas distribuidoras era mais de três vezes o preço
na fábrica, valendo notar que os donos desta são os mesmos daquelas ou, no
mínimo, têm participação naquelas.
15. Como se fosse pouco o que as transnacionais ganharam no
Brasil nos anos 60, no final desse decênio, elas foram agraciadas com novos e
colossais subsídios, através de isenções de IPI e ICM, nas importações de seus
bens de capital e insumos, além de créditos fiscais, na proporção das
exportações.
16. Até hoje, novos subsídios juntam-se aos antigos e
caracterizam o modelo dependente como aquele em que as empresas transnacionais
recebem imensos prêmios, doações e dinheiro para explorarem o mercado sem
concorrência, com seus carteis e oligopólios.
17. Por enquanto, as reservas no exterior se mantêm em US$ 370
bilhões e acima da posição da divida externa, de US$ 314 bilhões. Mas
isso significa desnacionalização galopante, pois decorre do brutal ingresso
líquido de investimentos estrangeiros diretos (US$ 62 bilhões de janeiro a
julho) e mais US$ 24 bilhões de investimentos estrangeiros em carteira
(participações de capital).
18. Além disso, só é possível o balanço de pagamentos com saldos
positivos, em vez de com enormes déficits, devido às aplicações estrangeiras em
títulos de renda fixa.
19. Elas totalizaram US$ 20 bilhões de janeiro a maio. Dados os
sintomas de crise, o Executivo suprimiu, em 04.06.2013, o imposto sobre
operações financeiras - IOF sobre essas aplicações, além de
aumentar a taxa de juros. Com isso elas atingiram US$ 7,1 bi em junho, mas
voltaram a declinar para US$ 3,9 bilhões em julho. De janeiro a julho:
US$ 31 bilhões.
20. Apesar de a maior parte das economias estrangeiras
praticarem juros reais baixos e até negativos, no Brasil voltou-se a elevar a
taxa básica dos títulos públicos: em julho, ela já foi para 8,5% aa, depois de
ter baixado em 2012, ficando em 7,25% aa. até abril de 2013.
21. Nada pode justificar as elevações verificadas desde então, a
não ser o fato de as autoridades monetárias agirem como serviçais dos bancos e
dos aplicadores estrangeiros, ou a dependência de ingressos de capital
para fechar as contas externas, devido ao déficit nas transações correntes,
causados pelo modelo desnacionalizante.
22. Parece claro, sem excluir a primeira hipótese, que a segunda
desempenha influência determinante. Tal como ocorre com os viciados em cocaína
e outras drogas, o Brasil, submetido ao modelo dependente, agrava cada vez mais
a dependência, recorrendo a doses cada vez maiores de drogas (capital
estrangeiro). Para isso, oferece a ele cada vez mais benesses para
atraí-lo.
23. A usual desculpa da inflação é mais furada que queijos
Emmenthaler e Gruyère, pois, além de ela apresentar-se em queda antes dos
aumentos na taxa de juros, estes não levam à redução da alta dos preços.
24. A maligna dependência não se limita a produzir crises
externas, como as que contribuíram para pôr de joelhos os submissos governos
brasileiros, como em 1982, culminando com os inqualificáveis Collor e FHC a
entregar de graça às transnacionais patrimônios públicos inalienáveis, conforme
exigiram os governos imperiais, coadjuvados por Banco Mundial e FMI. A política
submissa continua sob os governos petistas.
25. Por que os desastres produzidos pela dependência não se
limitam a isso? Porque ela faz crescer exponencialmente a dívida pública
interna, o que ocorre não só quando o capital estrangeiro aplica em títulos do
Tesouro - e este os emite - mas também em função das altas taxas de
juros, expediente “justificado” pela “necessidade de atrair aquele
capital”.
26. Terminou o espaço, e assim não posso aditar ao que tenho
escrito sobre a imperiosidade de se anular o último leilão de petróleo e de
cancelar o marcado para outubro, na área do pré-sal. Tenho só de conclamar os
compatriotas a participar das ações dos que estão lutando nessa direção.
Não só as ações judiciais, mas também as que transcendam as atuais regras
legais.
27. E ainda não é desta vez que resumirei a fraude em que os
governos entreguistas transformaram o setor de energia elétrica, criando um
caótico sistema de preços, “de mercado”, com o intuito de favorecer grandes
empresas, principalmente estrangeiras, as quais, enquanto sugam o País,
extinguem o seu futuro, acabando com sua infraestrutura.
* - Adriano Benayon é doutor em economia e autor do livro
Globalização versus Desenvolvimento.
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